Velhos de Bandeira
Aprendi com Bandeira,
Não devemos dormir em noites de São João.
Arriscamos acordar sem nossos queridos velhos.
O fato que eu, com uma exemplar infância 'concret jungle',
Dificilmente comemorei uma noite de João.
Enfim, não lembro de adormecer em Juninas Festas.
Mas acordei, algum dia, assim como o menino Manuel,
E meus queridos velhos já não estavam lá.
Digo lá porque é lá que sempre os presenciei.
Minha velha Rosa ao fogo
E seu borbulhante molho de tomate.
Incrível! Impregnava não apenas a casa, a rua,
Mas a minha infância.
Sinestésico ou não,
Hoje percebo aqueles tomates,
Aroma de meus domingos.
Mas estes se foram
E os tomates já não exalam.
Meu querido velho.
Nome de filósofo, literário.
Uma janela aberta, um jornal.
De costas ao mundo da Barra-funda
E de vistas postas ao universo da leitura.
Lia aquele velhinho e lia muito.
Um par divertido de óculos
E um bigode mal-humorado.
Era divertido esse mau-humor
Cinismo que só a loção pós-barba explicaria.
Um avó que não acredita em Deus,
Convicto das aspirações de Cuba e do Corinthians.
Coisas de Euclides. Saudade destas coisas.
Sobrou as lembranças. Uma cabeça cheia.
Adormeci e cresci, acordei com essa sensação.
Algum dia serei o velho querido de alguém
E também irei inesperadamente para esse lugar
Assim que esse alguém adormecer,
Esse lugar onde esses velhos foram,
De Bandeira ou de minha infância,
Estão todos adormecidos
com seus molhos, seus jornais,
Minha infância.
Guilherme Assen
Fevereiro de 2008
sábado, 22 de março de 2008
Tomates e Bigodes
sexta-feira, 21 de março de 2008
Algo entre o literário e o pessoal
Divina cobrança
Algo de bom, disse Deus.
E eu sem saber o que dizer.
Algo de bom?
Algo de bom já faço
Respiro,
Sem fazer nada,
O dia inteiro passo.
Mas algo de bom há de se fazer.
Ficar rico, escrever um livro.
Algo de bom, entende?
Rico! Todos querem isso.
Quero o que não querem.
E livro? Quê babaca lê?
Algo de bom, Deus,
Já faço.
Enfim,
Disfarço.
Guilherme Assen
Março de 2008
domingo, 9 de março de 2008
Abundância
O Luxo abunda
Hipócritas em hiper-crises,
Hipo-críticos de cega futilidade,
Personas non-gratas da sociedade,
Marginais de luxo
Fecham-se em seus blindados
Com medo de serem seqüestrados
"Esses marginais? Um absurdo!”.
Na mídia o luxo abunda
Na realidade à pobreza, a bunda.
Sobra ao homem comum,
O trabalho, o ônibus lotado,
O SUS.
"Ah! Meu filho vai ser Doutor!”.
A bunda ao SUS.
Vivem e mostram suas "Caras"!
Esquecem de nossas bundas.
Querem um mundo primeiro,
Não vivem em nosso país terceiro.
O lixo, a corrupção, abunda!
Envergonham-se de nossa posição geográfica
"Quem muito abaixa mostra a bunda!”.
Estranho, o lixo mostra-se por aí
Maquiado de luxo.
"A bunda é a bunda", afirmou Drummond.
Em nosso país, a bunda abunda.
Guilherme Assen
Setembro de 2007