domingo, 28 de junho de 2009

O Vira-lata da Literatura

Sérgio Vaz - agitador cultural equipado com armas de mais de 400 páginas transforma a realidade da periferia.

Mineiro, nasceu em 26 de junho de 1964 – praticamente, três meses após o Golpe Militar no Brasil. Ainda criança, saiu de Belo Horizonte para morar em Taboão da Serra, município pobre da região metropolitana de São Paulo que é considerado, por muitos, um “bairro” da periferia paulistana.

Cresceu envolto por livros, mas estudou pouco; Sérgio Vaz não chegou a cursar o colegial. Aos 15 anos de idade, começou a trabalhar como office-boy para uma agência bancária e teve que largar os estudos. Lembra, no entanto, que nos natais e em seus aniversários sempre ganhava livros como presente. “Desde sempre meu pai me comprava livros. Eram livros de sebo, baratos, judiados, mas que guardo com carinho por saber a importância que tinham para o meu velho”, relembra Vaz.

E então foram anos arranjando bicos para sobreviver entre uma leitura e outra. Vendedor, auxiliar de escritório, auxiliar de cobrança, feirante e outros tantos cargos em uma rotina de pontos de ônibus e cartões batidos distante de seu atual dia-a-dia. "Eu praticamente não existia. Saía para trabalhar como estivesse indo para a forca”, responde o poeta ao ser questionado sobre sua vida antes e depois da escrita.

Aos trinta anos de idade, conseguiu economizar parte de seu salário para editar seu primeiro livro de poemas, intitulado, simplesmente, de “Livro de Poemas”. Poucos exemplares foram impressos e, então, distribuídos para familiares e amigos. Com o tempo, Sérgio Vaz foi deixando de ser um “faz-tudo” para se tornar escritor.

Cinco anos após seu “Livro de Poemas”, Vaz reuniu alguns amigos e no dia 11 de fevereiro inaugurou a primeira Semana de Arte Moderna da Periferia. Na mesma data na qual Mario de Andrade, Manuel Bandeira, Villa-Lobos e outros tantos artistas se exibiram para quebrar os tabus da arte passadista, Vaz e seus companheiros se uniram para criar o que seria a Cooperativa Cultural da Periferia, a Cooperifa.

As reuniões eram feitas em uma fábrica abandonada, em Taboão da Serra. Sem organização prévia, o grupo se encontrava, todas as quintas-feiras, para recitar suas próprias poesias. Não havia censura, os poetas poderiam falar sobre tudo desde que as discussões fossem através de rimas. Com o tempo, a cooperativa ficou conhecida por Taboão e chegou a reunir em torno de 100 pessoas para o debate lírico. Todo esse destaque atingiu a imprensa e, logo que a prefeitura ficou sabendo da invasão cultural na fábrica abandonada, os agitadores foram expulsos. “Viramos o movimento dos sem-palco”, brinca Vaz.

O grupo passou a se reunir em botecos até que se fixaram no Bar do Zé Batidão, propriedade do pai de Sérgio Vaz, no bairro da Piraporinha. “Na periferia, espaço público ou é igreja ou é bar”, concluí o agitador cultural. Os artistas se reúnem todas as quartas para conversar e recitar seus versos. Como um líder, Vaz sempre senta ao lado de onde as apresentações acontecem, em um palco improvisado no canto do boteco. Saboreia o escondidinho do Zé e bebe duas ou três latinhas de cerveja. E é assim que Vaz define sua própria poesia: “maloqueira e periférica, toma cerveja e só fala o que não agrada”. Tem tanto carinho pela Cooperifa que ele próprio desenhou o símbolo da cooperativa, um garoto empinando uma pipa. O desenho fez tanto sucesso entre os idealizadores que todos eles tatuaram “Cooperifa” seguida do menino brincando com o “papagaio”. Tatuagem esta que Vaz faz questão de deixar exposta em seu braço direito.

Suas convicções e seus projetos conseguem criar oportunidades onde não há nada além de espaço. Sem teatros, cinemas e até mesmo escolas, Vaz se esforça para abrir caminho para que a arte possa se mostrar como alternativa às drogas e à violência. “Nunca vi Taboão tão violenta. Outro dia cruzei com um garoto que carregava uma arma com mais de quatrocentas páginas. Tem até adulto traficando conto”, diz Vaz entre gargalhadas.

Atualmente, o poeta trabalha a hora que bem entende, apenas escrevendo e produzindo projetos culturais. No entanto, afirma que nunca trabalhou tanto e que usa sua insônia e seu vício em café como aliados para escrever cada vez mais. Não bate cartão e, raramente, sai de casa. Mora, no próprio bairro de Piraporinha, em Taboão da Serra, na mesma rua na qual acontecem os saraus. É casado, há quase 20 anos, com Sônia e é pai de Mariana, uma garota de 15 anos pouco interessada por livros, mas apaixonada por música.

Vira-lata da literatura, como se autodefine, o poeta marginal tem colecionado elogios. Seus textos e seus projetos extravasaram a periferia e ganham a aprovação dos meios acadêmicos e dos grandes veículos de comunicação. Antonio Vicente Pietroforte, poeta e lingüista pesquisador da Universidade de São Paulo, considera o líder da cooperativa um herói. “Vaz está fazendo o que aluno nenhum de letras se preocupa em fazer. Promove a leitura e a escrita, não importa onde, não importa a condição”, afirma o pesquisador. Pietroforte já chegou a, inclusive, dividir alguns recitais com Vaz e diz que ainda o fará participar das atuais altas rodas literárias.

Vaz não se preocupa com isso. Diz preferir os moleques do morro aos professores universitários. No entanto, reconhece a importância da amizade com o lingüista afirmando que o quer cada vez mais perto de seus projetos. O poeta marginal já publicou seis livros sendo os dois últimos – Cooperifa: Antropofagia Periférica e O Colecionador de Pedras – editados e comentados por Heloísa Buarque de Hollanda, aclamada ensaísta e crítica literária brasileira.

Entre pedras e leituras, Vaz culpa a má administração pública pela ausência da cultura na periferia. O poeta já assumiu por diversas vezes discursos panfletários de ataque e revolta. Hoje prefere escrever e se movimentar. “Já não podemos esperar mais nada desses engravatados (políticos), até prefiro assim. Saindo das minhas mãos, garanto que será bem feito”.

sábado, 13 de junho de 2009

In a Mission From God

Há alguns anos assisti The Blues Brothers (1980), dirigido por Jonh Landis. Produção recheada pelo nonsense e pelo cinismo de Jonh Belushi e de Dan Aykroyd nos papéis de "Joliet" Jake e Elwood Blues - dois irmãos, malandros e sádicos, movidos pelo talento musical e pela pilantragem.



O longa é resultado de um dos mais conhecidos sucessos de Saturday Night Live, programa transmitido há mais de 30 anos pela rede norte-americana NBC. O quadro, no qual Belushi e Aykroyd caricaturavam músicos de Jazz e Blues, tornou-se tão popular que rendeu dois projetos paralelos: The Blues Brothers Band, lançado pelo disco Briefcase Full of Blues (1978), e The Blues Brothers, adaptado para a telona em parceria com Jonh Landis.

Tão divertido quanto genial, o filme é marcado por participações de ícones da música como James Brown, Cab Calloway, Ray Charles, Aretha Franklin e - o bad like Jesse James - Jonh Lee Hooker.

De Sweet Home Chicago a Minnie the Moocher, são 2h30 de ritmo e solos de gaita, guitarra e baixo. A banda passa por praticamente todos o mais tradicionais estilos da música norte-americana e chega até a deixar gravada a sua versão de Stand by Your Man, imortalizada pela folclórica rainha do Country, Tammy Wynette.

The Blues Brothers Band gravou outros tantos discos e continua se apresentando em turnês pelos estados norte-americanos e por outros países. A produção chegou a filmar Blues Brothers 2000, suposta continuação da saga dos irmãos Blues, mas, sem a participação de Jonh Belushi, o filme não impressionou e acabou sendo deixado de lado pelos fãs e, até mesmo, pelo próprio Dan Aykroyd.

The Blues Brothers (1980 - Universal Studios) foi um presente dado por Lalá Cabrini. Em quase dois anos de amizade, o pequeno cronópio já me presenteou com sorrisos, abraços, livros e filmes inesquecíveis. Amor para além das belas-artes.

sábado, 13 de dezembro de 2008

People Watching

Voltando para casa, entrei em um ônibus quase que por vontade alheia. O motorista abriu as portas e então bastou ensaiar uma entrada que, junto comigo, molhado, outra dezena de pessoas , molhadas, completaram o espetáculo. No entanto, estava em um dia de sorte - acontecimento nada rotineiro - e encontrei um assento vago antes da catraca. Não iria descer tão cedo e mesmo que tivesse que descer, sentaria; costuma ser o melhor lugar de um ônibus. Pode ser que o motorista, já entediado diante dos quilômetros de asfalto, faça piadas sobre o que vê pelo transito, ou xingue de forma engraçada os motoqueiros que passam azucrinando. algum velhinho pode sentar-se ao meu lado e começar a contar histórias, tão cheias de memórias, pois, de fato, os velhinhos são muito bons de papo e nunca se sabe, ao certo, o que esperar dos primeiros lugares de um ônibus cheio.

Nada disso aconteceu. Apenas fiquei sentado, ouvindo música. Em alguns momentos tirava os fones de ouvido como um movimento de esperança para tentar ouvir algo ou escutar algum xingamento e torcia o bico diante do mormaço de um ônibus chuvoso, mas nada parecia sair de boca alguma e o tédio, molhado, arrastava o tempo e o espaço. Todos amassados, amontoados, cansados. Quinta-feira-chuvosa.

E de repente, ao meu lado, uma senhora sentou. Perfumada, lembrava-me àquelas avós de contos que lia na infância. Carregava um saco de suspiros e os comia com tamanha graça que eu rejuvenescia dois ou três anos a cada suspiro que ela retirava do pacote e levava até a boca. Quando eu já estava muito aquém de puberdade, ela levantou os braços e falou: "Que caloooor!". E todos riram e, finalmente o motorista disse: "Tem razão. Puta que o pariu! Que calor!". E a senhora, encabulada e com um suspiro na eminência da boca, olhou para o motorista com evidências de reprovação. Todos, outra vez, riram. A velhinha, não molhada, fazia com que as rodas andassem mais rápido, acordava o cobrador e, colorida, despertava a atenção daquela massa amorfa e molhada que sacolejava, vez ou outra, em curvas mais fechadas. E todos, novamente, riam.

“Todos”, assumo, foi um erro. Um velhinho, do outro lado do corredor, não esboçava prazer com toda aquela graça. Lia um jornal amarrotado e, de vez em quando, olhava as horas em seu relógio; não se pode ser feliz encarando um relógio a cada cinco minutos.

E, então, os suspiros foram largados ao meu lado – relutei para não tocá-los – e a senhora, suspirando, voltou-se para o velhinho do jornal, talvez de mesma idade com menos suspiros e mais espiadas ao relógio.

- O senhor não se importa de abrir um pouco essa janela?
- Não. Não.
- Coisa pouca. Um palminho, nem isso.
- Não. Não. De fato...
- O senhor não sente, mas o ar daqui está viciado. E essa chuva...
- De fato, minha senhora. De fato.
- Obrigada.
- Magina. Magina.

A janela foi fechada pelo velhinho que amassou o caderno de esportes e, disfarçadamente, olhou por mais uma vez os ponteiros de seu relógio que haviam andado apenas o espaço de cinco minutos. Abafado e sólido, nem por isso o ar deixaria de ser viciado. Estamos em São Paulo, estamos em 2008 e aquela velhinha comendo suspiros não pertence a espaço ou data alguma – quanto mais a estes. O ônibus seguiu lotado pela Consolação, a velhinha terminou seus suspiros, o velhinho leu todo o caderno policial, atravessei a catraca, desci no ponto de sempre e cheguei um pouco mais jovem em casa. Dias chuvosos são agradáveis à leitura, ao ócio e aos suspiros.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Sobre liberdade, peladas e cuecas

Todo final de semana, chego à mesma conclusão que as sextas-feiras são os meus dias favoritos. Claro que não são apenas os meus dias favoritos, há muita gente que idolatra uma boa sexta; enfim, de fato, não há sábado que dê conta desta preferência. Depois de assumir tão exaltada idolatria, acredito que não preciso começar a narrar esta crônica com o já clássico “era uma sexta-feira”, mas vale avisar: era uma sexta-feira. E o sexto dia da semana, para mim, é dia de futebol e de samba. Após vinte e duas aulas semanais, preciso apenas suportar mais duas curtas aulinhas e jogar-me em alguma quadra ou alguma roda.

Almoço com pressa, como sempre. Um bom banho para tirar toda a tensão da semana e estou pronto para fazer minha mala. Não que vá fugir para algum lugar, mas gosto da sensação de liberdade. Tênis, meia limpa, camisa do verdão, camisa limpa, bermuda, calça jeans, desodorante, uma boa e velha toalha, sabonete, xampu, caneleira, meião e pente. Mala feita!

Roubo uma maçã da geladeira e ganho a calçada de meu prédio. Ando alguns metros e estou no ponto de ônibus; espero pelo demônio amarelo, demônio porque o maldito sempre demora mais do que trinta e cinco minutos para, finalmente, parar em minha frente com suas convidativas portas abertas, e amarelo por simplesmente ser amarelo.

Sempre que subo em um coletivo, sigo um ritual. Jogo a mala para o lado direito do meu corpo para facilitar minha passagem pela catraca, apalpo minhas calças para garantir que minha carteira e meu celular ainda estão nos bolsos nos quais os coloquei, ligo meu mp3 e levo os fones até meus ouvidos. Praticamente um fordismo do comportamento. Tudo tem sua ordem, toda ordem produz alguma coisa e esta rotina sempre leva ao mesmo lugar: os últimos assentos do ônibus. Minhas músicas também são, estranhamente, ordenadas. Sempre samba, é sexta-feira, e sempre começo por Noel e sua melancolia de Vila Isabel, e acabo com Chico Buarque, sua criatividade e poesia. Apesar de você, demônio amarelo, quarenta e cinco minutos depois, eu chego às portas de minha faculdade.

Sem paciência para esperar o elevador, subo correndo os seis andares que me separam de minha mais que almejada pelada. Ainda restam duas horas até o sinal de minha primeira aula. Um aquecimento rápido, finjo alongar minhas pernas e pronto! Carrinhos, ponta-pé para cá, ponta-pé para lá, cabeçadas, broncas, xingamentos, defesas, gols e meu suor escorre, e meu sorriso surge, e meu alívio chega. É sexta-feira!

Talvez a hora mais desagradável seja o vestiário após a peleja. Todos resolvem tomar banho ao mesmo tempo. Desodorantes e perfumes masculinos, sinceramente, não me agradam e empesteiam cada metro cúbico do já tão cúbico vestiário. Ossos do ócio.

Um banho rápido, toalha e pente. O chinelo estapeia o chão até o banco onde deixei minha mala. E então, o declínio: esqueci-me de uma cueca limpa. Podem imaginar o quanto uma cueca seria a salvação daquela sexta-feira? E então, o dilema: vestir a cueca que usei para jogar, mesmo que esteja irreconhecível após duas horas de jogo; ou simplesmente não vestir nada e enfrentar o desconforto pelo resto do dia. Óbvio, tomo por minha a opção mais higiênica e assumo esta liberdade. Afinal, quem precisa de uma cueca? Somos reflexos do século no qual as mulheres queimaram os sutiãs; espero ser o mártir do movimento pelo bicho solto!

Meu andar já não é tão feliz. Minha sexta já não é tão esperada. Quero a porta da minha casa, o corredor, a porta do meu quarto, a porta do meu armário, a terceira gaveta da esquerda e uma cueca, não importa cor ou modelo, apenas uma cueca. E o querer toma conta e já não quero a roda ou a quadra. Entro na sala e decido prestar atenção ao máximo nas duas aulas para que estas cinco horas passem o mais rápido possível.

Sala cheia! Em plena sexta-feira, uma sala cheia! Tenho certeza que todos estão presentes para rir de minha desgraça. De certo já sabem da ausência de minha cueca e querem presenciar meu vexame, meu caminhar desajeitado. Sento na primeira cadeira que encontro, cruzo as pernas e espero. Espero que o tempo passe rápido, que ninguém fale comigo, que não precise levantar para nada, enfim, espero.

O tempo não passa. Todos falam comigo. Minha borracha escapa de minha mão e corre para longe de minha cadeira umas três vezes. E quando o tempo passa, já não sei se quero levantar. Espremido entre tantos, pareço não querer seguir meus próprios passos. E estes passos me levam ao ponto de ônibus. O anjo azul chega com suas portas sorridentes. Acredito que não preciso explicar a cor e o anjo. Ônibus lotado, de certo o pessoal da sala espalhou por São Paulo inteira que estou sem cueca. Todos olham, de lado, quase sorrindo, minha desconfortável postura. Sacolejos, com o perdão da expressão, torturam-me. Já não obedeço a rituais, levar os fones aos ouvidos é perda de tempo. Não importa o pandeiro, Noel, Cartola, o bumbo; o que escuto é um estridente cavaquinho que irrita e faz questão de lembrar-me a saudade que estou de uma cueca. O mundo me condena e ninguém tem pena.

Chego ao terminal próximo a minha casa. Mais alguns passos e terceira gaveta da esquerda! Mais alguns passos e cueca! Elevador, porta de casa. O barulho da chave desperta meu pai, quase imóvel no sofá após uma sexta-feira carregada. Ele corre e destranca a porta para que eu possa entrar. Olha em meus olhos e pergunta:

- Como foi a sexta, filhão?
- Péssima, pai. Péssima.

Mal sabe meu velho que nem sempre a liberdade é bem vinda.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Chama o milico! Chama o milico!

Ontem (domingo, 05 de outubro de 2008) votei por minha quarta vez. Carreira eleitoral ainda curta, mas já gabaritada do plebiscito ao segundo turno de eleições presidenciais. Prestes a completarmos 20 anos, e refiro-me aos meus e aos da Constituição, contemplamos um show de eleições - candidatos piadistas, eleitores dramaturgos e personagens já típicas de nosso universo democrático.

Tão pouco panfletário quanto destro, não sou a favor de ditaduras e regimes extremistas - temo os generais e os camaradas no poder. No entanto, o que fica é a impressão de que ainda não fomos educados para sermos diretos, . Enfim, toda esta lacuna entre poesias e ritmos deve-se às seguintes declarações:

"É um novo momento, uma nova eleição. Eu sabia desde o primeiro dia que eu iria ao segundo turno. Não sabia contra quem, mas sabia que iria para o segundo turno. (...) Eu tenho o melhor cabo eleitoral [presidente Lula], que é o maior líder brasileiro, quiçá o maior líder que o Brasil já teve"

Marta Suplicy, candidata do PT à prefeitura do município de São Paulo


"Pela manifestação dos eleitores, eu não poderia deixar de registrar a importante participação nessa avaliação de governo da figura do governador José Serra. Com muito respeito ao PSDB e ao candidato Geraldo Alckmin"

Gilberto Kassab, candidato do DEM à prefeitura do município de São Paulo

fonte: http://campanhanoar.folha.blog.uol.com.br/

Máquinas públicas como cabos eleitorais. Lembro, do ainda pouco que li, dos já velhos e direitos cabos que expunham suas opulentas metralhadoras e seus temidos alicates a todos aqueles que gritavam contra a ditadura. Deixo, já que é um blog pessoal, minha opinião de pouca valia: cuspimos, mais uma vez, na testa da grega velha.

Quanto ao título, deixem o milico enterrado e passado. Usei a má expressão apenas por gostar muito da já eterna música de Chico, não por esperar que volte tal tormenta.

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Do pouco que entendo de sentimento poético

Digo que a poesia
é um modo de ser
criança - cria
para onde quer.

As frases têm pernas:
Os poemas convidam
ao som e às imagens
das palavras amigas.

(Fernando Paixão. "Fantasia de autor".
in: Dia brinquedo. São Paulo: Ática, 2004.)

Olhos arregalados, olhos de quem enxerga o mundo pela primeira vez. Audição, visão e olfato em seus estados mais exaltados. Pouco fala, muito pensa; pensa em palavras, ritmo, rimas e anáforas. Cada instante de sua visão é reduzido a métrica e ampliado ao sentido. A construção poética revela então um outro mundo. Texto escrito. Ponto final posto.

Olhos arregalados, olhos de quem enxerga aquela página pela primeira vez. A visão esbanja preferência e a audição e o alfato tornam-se quase imperceptíveis. Pouco fala, muito pensa. Pensa em palavras, significados, figuras de linguagem e de pensamento. Cada métrica é ampliada à sua visão e o sentido extraído de cada rima, cada anáfora. A leitura poética revela então um terceiro mundo. Nunca o presenciado pelo poeta, jamais o metrificado, mas sim o contextualizado. Texto lido. E o ponto jamais é final, apenas um convite à releitura.



Estou lendo "Versos, sons e ritmos" da Prof. Dra. Norma Goldstein. Livro curto, mas de importância absurda. Recomendo a todos que gostam de poesia e lingüística.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Somos tropicais, não somos?

Todos sabem que moramos em um país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza. Os trópicos nos deram o clima e os gringos nos nomearam latinos. Criamos então o chorinho, o samba e a bossa-nova; o Brasil marcava o mundo com seu ritmo e sua cultura digna da antropofagia pretendida por alguns modernistas. 1964 e muitos Atos Institucionais depois, enfrentamos uma ditadura militar que nos podaria em cada verso, em cada nota musical. Movimentos surgiram e até 1968 vivemos um clima de revolta de alma estudantil e faces juvenis, que se caracterizaria de esquerda e iria lutar contra aqueles que, com a tesoura na mão, faziam questão de decepar qualquer idéia de liberdade que brotasse em cabeças brasileiras.

Os movimentos de tradição esquerdista tomaram como marca a nossa cultura, era preciso ser patriota para derrubar a ameaça armada. O violão e os versinhos de Vinicius estariam em boas mãos: os jovens cantavam Jobim e assistiam Glauber Rocha, nada mais brasileiro do que ser alheio ao mundo, ser nacional. Era preciso construir uma geração de patriotas disposta a gritar contra a ditadura.

Do mesmo modo que a ferrenha ditadura acabou por criar a força dos movimentos libertários, essa radical esquerda provocaria o que viria a ser verdadeiramente tropical. O rock, as psicodélicas guitarras elétricas de Alegria, Alegria; o pop, o erudito e o brasileiro juntos: nascia a Tropicália.

Quebrando qualquer corrente brasileira já existente e baseando-se no movimento hippie norte-americano, o tropicalismo trouxe o verdadeiro sentimento libertário ao país. O movimento ocorreu entre 1967 e 1968, e trouxe ideais novos sobre sexo, música, comportamento e política. Um ódio movia a avant-guarde de baianos que chocavam as platéias dos festivais da TV Record acostumados a Buarques e Vandrés. "Viva a palhoça-ça-ça!". Gilberto Gil, Caetano Veloso, Tom Zé e outras feras que compunham e inovavam a cada verso, jogaram-se contra tudo o que era convencional e marcaram à guitarras elétricas o novo jeito brasileiro de ser: o escândalo das cores, o ritmo, a poesia, a política de tudo que é contrário à dominação e a favor de tudo que é vinculado à liberdade de expressar o que se bem entende.

Os tropicalistas foram perseguidos e Caetano e Gil presos em dezembro de 1968. A ditadura rompia a vanguarda, mas a vanguarda romperia a ditadura mais tarde e perduraria até os dias de hoje, 40 anos depois, com as músicas, poesias e obras de arte que eternizariam as roupas coloridas e os cabelos encaracolados desses nobres tropicais.


Discurso de Caetano como reação às vaiais do auditório dos festivais de música da TV RECORD.

Que juventude é essa? Que juventude continua sendo essa?

terça-feira, 15 de julho de 2008

Sobre batuque e pandeiros mancos.

Pandeiro, pão-Demônio


Velho pandeiro que agora espanco,
velho, de couro velho e um prato manco,
madeira machucada que o tempo marcou,
em você marco o ritmo, a raiva e o que aqui passou.

O tapa é o forte que me abate.
O ritmo é a alegria - que esta não me mate.
O som quase típico, o copo inteiro etílico,
amigos rindo, alguém cantando e eu espanco.

Estanco o que de mim se aflora.
Nasceu a raiva e o nervosismo sua presença implora.
Morre aqui nesse tapa, meus devaneios,
meus medos, e em meus dedos, minha demora.

Morre o pensar, o penar, o esperar.
Morre ela e tudo o que dela minha solidão explora.
Nasce o riso, o pranto tolo. E outra samba,
e outra canta e eu rebolo.

Mão que de tanto bate que se abate o embate.
Desilusão, um toque, um tchau e um "vai-te...".
À merda, é claro. Porque pandeiro é malcriado
e de tanto apanhar fez-se meu criado.

Guilherme Assen, poema ao meu velho.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

A Bela e a Feira



Profetisa.

Ela vai para Austrália.
Depois de tudo, ela vai em boa hora.

Profetas, aos prantos, declamarão:
"Casará com um aborígene,
pintará o cabelo de roxo
e aprenderá a surfar!

Os amigos, todos eles,
em São Paulo vai deixar.
Por um sonho, maior que ela,
diz a Bella, que vale a pena buscar".

Rimas fracas de profeta.
Coração amigo de poeta fraco diz:
"Saudade. É tudo que vou guardar."

Já não sambo com mais ninguém.
Volte, minha nêga.
Volte e me faça sambar.

Guilherme Assen.

Sábado fui à Feira Moderna - lugar apaixonante. Loja de artesanatos e café durante o dia, bar e palco para o samba durante a noite. Um jardim bem cuidado e frequentadores bonitos. Cerveja Original e pinga original do nordeste, a Cajuína. A caipirinha é boa, mas isso já é uma redundância; com tantas qualidades e com bom samba qualquer limão e pinga ganha vida.

Garotas de vestidos azuis (ou verdes) também são vistas por esse lugar. Graça, beleza e samba. Samba de branco, de mulatos, de negros e de japoneses. Samba não tem cor, tem graça. Feira Moderna é um canto interessante na altura do número mil-duzentos-e-quarenta-e-poucos da rua Fradique Coutinho, Vila Madalena, São Paulo, São Paulo.

Para aqueles que não conhecem samba ou cajuína, fica a oportunidade. Para aqueles que conhecem garotas de vestidos verdes (ou azuis) corram pois estas costumam a sambar sozinhas, não falta homem, falta atitude. E para a Dona Isabella, que em breve deixará nosso Pindorama e rumará para sua aventura por terras australianas, toda a sorte e felicidade do mundo. Amo você e espero a volta da amiga para qualquer samba, qualquer dia desses.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Ao Mestre, com carinho

"Os verdadeiros versos não são para embalar,
mas para abalar..."

- Mario Quintana